sexta-feira, 16 de maio de 2008

A Investigação-Acção

A INVESTIGAÇÃO-ACÇÃO
No âmbito desta semana de estudo em torno do polémico tema da Investigação-Acção, deparei-me, na clássica obra de Richard I. Arends - Aprender A Ensinar (Alfragide, McGraw-Hill, 1997), com uma unidade intitulada «Investigação-Acção Para O Professor».
Entre as páginas 525 e 534, o autor faz uma excelente síntese da Investigação-Acção, começando por afirmar que «os professores podem tornar-se investigadores, com o objectivo de contribuírem para a melhoria do ensino e dos ambientes de aprendizagem na sala de aula».
A Investigação-Acção consiste, como toda a investigação, num processo de colocar questões, procurar respostas válidas e o mais objectivas possível e de interpretar e utilizar os resultados. A sua especificidade está no facto de ter como objectivo a aplicação imediata, consistindo «num processo de aquisição de informação e conhecimento para ser posto ao serviço do próprio professor/investigador que o realiza».
Este modo de fazer investigação resulta de mais de um século de pensamento e foi muito influenciada por John Dewey (que lamentava a apropriação, por parte das ciências sociais, do modelo das ciências naturais, o que conduziu à separação entre ciência e prática), Kurt Lewin e Les Corey e associados no Teachers College. Mais recentemente, o campo foi influenciado por Donald Schon e Chris Argyris.
Arends recorda o papel de Lawrence Stenhouse (1975, 1983, 1984) e de David Hopkins (1985), os quais muito contribuíram para que, hoje em dia, a ideia do professor como investigador ganhe cada vez mais aceitação nos EUA, Reino Unido, Canadá e Austrália.
Seguidamente, apresenta as duas premissas que considera serem a base da Investigação-Acção:
- O profissional autónomo (na linha do que pensava Stenhouse, os professores não devem depender de directores, supervisores ou professores universitários para lhes dizerem o que fazer, mas devem ter autonomia para criarem eles próprios conhecimento);
- Informação é poder (os próprios professores é que devem recolher informação válida sobre as suas aulas; utilizar essa informação para tomarem decisões fundamentadas relativas a estratégias de ensino e actividades de aprendizagem e partilhar informação com os estudantes para os motivarem).
O autor invoca depois os sete passos de Lyman para a Investigação-Acção:
1. Pensando na sala de aula, identifique um problema que pensa poder ser resolvido recorrendo a uma abordagem diferente ou a outra estratégia de ensino.
2. Explicite uma questão que inclua as variáveis independente e dependente(s).
3. Repare que a diferença (ou diferenças) que procura constituem as variáveis dependentes.
4. Decida quais são os indicadores das variáveis dependentes.
5. Planeie a experiência, de modo a manter constantes o maior número possível de variáveis.
6. Peça auxílio para a recolha dos dados.
7. Organize e escreva os resultados de modo a que possam ser partilhados com os outros, particularmente com os colegas e os alunos.
Segue-se a apresentação da condução da Investigação-Acção, começando pelas três partes fundamentais do processo:
1. Decidir quais os problemas a estudar e explicitar as questões concretas.
2. Recolher informação válida.
3. Interpretar e utilizar esta informação com o objectivo de melhorar o ensino.
Assim, os passos da Investigação-Acção são os seguintes:
1. Formulação do Problema e Questões
2. Recolha de Informação
3. Interpretação e Utilização da Informação
A fase mais complicada é, sem dúvida, a primeira: a identificação de um problema específico e a definição cuidadosa das variáveis envolvidas. David Hopkins identificou 5 princípios:
1. O problema não deve interferir com a actividade principal do professor, que é o ensino, pois o objectivo da I-A é compreender e melhorar o ensino e não o prazer de fazer investigação pelo prazer intrínseco que esta possa trazer.
2. Os métodos de recolha de dados não devem ocupar excessivamente o professor, já de si muito ocupado.
3. Os métodos utilizados devem facultar informações fidedignas e válidas, apesar de o objectivo não ser generalizar. Se os métodos usados não forem rigorosos e a informação resultante não for precisa e válida, o seu valor é nulo.
4. O problema a estudar deverá ser de particular interesse para o professor e ser susceptível de solução.
5. As normas éticas de investigação também se aplicam à investigação conduzida pelos professores, obviamente: informar os sujeitos sobre os objectivos do estudo, obter autorização destes antes da recolha de informações sensíveis, manter a confidencialidade e respeitar os direitos dos sujeitos.
Sobre os problemas, Arends afirma que, por vezes, estes não podem ser claramente explicitados no início e acrescenta que um bom problema é aquele que:
1. Pode ser formulado em termos de questão.
2. Diz respeito a relações entre variáveis.
3. É susceptível de teste empírico.
Apresenta as três categorias de questões com que o professor se depara normalmente na escola:
1. Questões relativas às opiniões dos estudantes
2. Questões relativas a procedimentos ou estratégias de ensino particulares
3. Questões relativas à comparação entre diferentes abordagens ou variações da mesma abordagem no tempo ou com grupos diferentes.
Quanto à recolha da informação, existem várias formas de recolher, umas mais complexas que outras. A decisão depende das questões a que se pretende responder e do tempo que o professor tem à disposição para recolher e analisar a informação. São sugeridas quatro abordagens possíveis:
- Questionários
- Entrevistas
- Observações
- Notas e Diários.
O capítulo termina com um exemplo de Investigação-Acção efectuada por um docente em início de carreira, aquando da sua formação inicial, levada a cabo no ano de 1989.

Reflexão crítica

Penso que as palavras de Arends vão no sentido de desmistificar a tradição positivista e tradicionalista que tende a identificar investigação com o paradigma quantitativo e a desvalorizar as metodologias essencialmente qualitativas. A Investigação-Acção, apesar de usar também métodos quantitativos, não rejeita a subjectividade, antes pelo contrário, assume que o investigador deve até ter uma atitude militante, o que não invalida que não seja honesto e rigoroso. A Investigação-Acção, inicialmente silenciada pelos manuais de investigação, à medida que desenvolve e cria cada vez mais conhecimento, derruba, gradualmente os dois mitos basilares da ciência clássica: o mito da independência e da objectividade e o mito de que a investigação é algo que só um escol de especialistas é capaz de realizar com qualidade.