quarta-feira, 16 de abril de 2008

A minha reflexão sobre o tema «O processo de Investigação»

Durante várias semanas, estivemos envolvidos em tarefas (quer individuais: leituras, quer em pequeno grupo: criação de um guião sobre as etapas do processo de investigação, quer em grupo-turma: debate no fórum), no sentido de nos apropriarmos das questões essenciais que envolvem o complexo processo de um trabalho de investigação científica, independentemente do paradigma que o suporta.
O ponto de partida para a construção dos guiões, foi, além da bibliografia indicada pelas nossas docentes, a análise de uma tese de mestrado apresentada na Universidade do Minho, em 200, intitulada «As TIC no Jardim-de-Infância: Contributos do Blogue para a Emergência da Leitura e da Escrita», da autoria de Adília Faria e orientada pela Professora Doutora Maria Altina Silva Ramos.
As questões trazidas ao debate foram, essencialmente, de cariz epistemológico e metodológico e, apesar de se ter chegado a alguns consensos, houve aspectos que apenas aflorámos e que serão objecto de estudo mais aprofundado ao longo de todo o semestre. Penso que esta primeira actividade assumiu um carácter propedêutico, o que se traduziu numa poderosa mais-valia, funcionando também como fase de motivação. No meu caso, foi extremamente importante, porque a necessidade de abrir um blogue (com o qual ainda funciono a meio gás) começara a desmotivar-me.
Mas vejamos, então, que questões foram abordadas durante o intenso debate que se gerou?
Em primeiro lugar, surgiu a problemática «dedução versus indução» e sua ligação aos métodos «quantitativos versus qualitativos».
Curiosamente, tudo começou por um lapso num dos guiões, pois, numa perspectiva mais simplista (como a que aqui se pretendia, nesta primeira fase), é evidente que a abordagem dedutiva (do geral para o particular) é característica das metodologias quantitativas e a indução (do particular para o geral), das metodologias qualitativas. No entanto, convocou-se estudiosos como Egberto Ribeiro (www.fsp.usp.br/rsp), o qual considera que «epistemologicamente, todos os métodos são dedutivos a priori (partindo de hipóteses imaginadas pelo pesquisador nas suas experiências de vida e em estudos teóricos) e indutivos a posteriori (partindo de dados recolhidos em campo, em laboratório em na literatura).
A conclusão a que chegámos foi a de que devemos evitar maniqueísmos e bipolarização de conceitos, o que nos arrastou de imediato para o problema dos paradigmas: quantitativo versus quantitativo, passando primeiro pela definição do conceito.
Invocou-se Thomas Kuhn, um dos pais deste tão recente conceito (ao qual chegou a atribuir vinte e dois sentidos); Masterman que os reduziu para três; Fritjof Capra e Edgar Morin, entre outros. Independentemente dos resultados a que (não) chegámos, o mais importante foi a vivacidade e a riqueza do debate, mas, para mim, a definição mais clara parece ser a de Capra (1997) «constelação de conceitos, valores, percepções e práticas partilhadas por uma comunidade, a qual forma uma particular visão da realidade que é a base do caminho para a comunidade se organizar a si própria».
Após uma renhida discussão sobre conceitos como ruptura, crise, inovação e revolução científica, como a maioria se inclinava para a ideia de que os paradigmas, embora mudando lenta e gradualmente, quando dão lugar a outros, são completamente distintos, o debate inclinou-se para a hipótese de se poder ou não considerar que há paradigmas mistos.
A primeira ideia a clarificar foi a separação entre a ideia de paradigma e a de método, sendo aquele, o todo e este, apenas uma das suas componentes. Portanto, ficou assente que, numa investigação, pode (e até deve) usar-se metodologias mistas: quantitativas e qualitativas. Particularmente em educação, as taxas e os números têm que ser sempre complementados com outro tipo de análises (antropológicas, sociológicas, enfim, qualitativas). Exemplificou-se com a famosa questão dos rankings, que a comunicação social divulgou sem uma contextualização e comprometeu a sua utilidade, pois as leituras meramente quantitativas até podem deturpar a realidade.
O debate passou também pela seguinte dúvida: ao elaborarmos um guião de investigação, até que ponto é importante clarificar em que paradigma nos inserimos, desde que fique clara a questão das metodologias? Apesar de todos os grupos terem dado ênfase a este aspecto nos respectivos guiões, analisou-se vários índices de estudos publicados e constatou-se que muitos eram omissos sobre o paradigma. Interrogámo-nos sobre a possibilidade de esse facto se prender com as diferenças entre projectos académicos e a sua posterior divulgação para um público menos especializado, o que logo alimentou outra vertente do debate: fazer investigação exige competências tão especializadas que só uma elite poderá adquirir? Será possível passar do tão apregoado espírito investigativo à realização de verdadeiros projectos de investigação por parte, por exemplo, dos professores dos níveis básico e secundário? A maioria achou que ser professor é incompatível com ser investigador, o que rejeito, pessoalmente. Acho que as escolas básicas e secundárias devem ser fontes de currículo e, como tal, devem ligar-se a centros de investigação e realizar os seus próprios projectos, a partir dos problemas específicos do seu dia-a-dia, na tentativa de encontrar explicações para os seus problemas e de intervirem de um modo cientificamente conduzido.
Entre várias celeumas sobre aspectos como exactidão e rigor, objectividade e subjectividade, razão e emoção, senso-comum e ciência, conceito de lei… convocou-se até a célebre polémica entre Boaventura Sousa Santos e António Manuel Baptista, a propósito do paradigma dito científico versus paradigma pós-moderno, a qual abalou a comunidade científica portuguesa há anos atrás.
Quanto à análise dos guiões produzidos, constatou-se que, apesar da diversidade dos mesmos, todos contemplavam os passos essenciais de um projecto de investigação, a saber:
. calendarização/gestão do tempo;
. definição do problema;
. objectivos científicos;
. enquadramento teórico (estado da arte, revisão bibliográfica);
. definição e caracterização da amostra;
. caracterização das técnicas de recolha de informação e seus protocolos de aplicação;
. aplicação das técnicas de recolha de dados;
. técnicas de análise de dados;
. análise dos dados recolhidos;
. apresentação das conclusões;
. apresentação das referências bibliográficas.
Concluiu-se também que não há divisões estanques entre as várias etapas, havendo mesmo uma acção dialéctica entre as mesmas.
Sobre a questão mais polémica desta actividade, ou seja, sobre podermos ou não admitir que existem paradigmas mistos e, mesmo nunca esquecendo que metodologias e paradigmas são conceitos distintos, continuo a achar que, se um paradigma é «uma dimensão transversal a toda a investigação» e está «implícito na formulação da problemática, dos objectivos, do estudo empírico e da análise de dados e também nas conclusões» (Professora Luísa Aires, intervenção no fórum, a 12 de Abril de 2008, pelas 19 h e 12 m) e se «paradigmas diferentes (…) não poderão afirmar-se em exclusividade» apesar de se fazer «uma análise em separado» (Maria Ivone Gaspar, Alda Pereira, António Teixeira e Isolina Oliveira, Paradigmas no Ensino e na Aprendizagem, 2008, 28), então, o paradigma sócio-crítico, por exemplo, pode ser considerado um paradigma misto.
Acrescento apenas a este relatório crítico que considero o paradigma qualitativo o mais adequado à investigação educacional, pois permite usar metodologias interpretativas, etnográficas, construtivistas, interaccionistas, observacionais-participativas e estudos de caso, assim como, evidentemente, as quantitativas, porque, como alguém afirmou «o papel dos dados de pesquisa e das análises estatísticas poderia ser comparado ao dos candeeiros de rua: proporcionar um suporte ao caminhante cansado, mas não necessariamente dar luz» (Égide Royer, 2007, 9, in Violência na Escola, um desafio mundial. Lisboa: Instituto Piaget).